Um meninozinho preto
Que não tinha liberdade,
Que vivia numa fazenda
Sofrendo muita maldade:
Meu cordel vai falar dele
Pr’ocês e pra toda a cidade.
Quisera muito eu que isso
Não fosse verdade não,
Mas foi fato acontecido,
Não aqui no meu sertão,
Mas lá nos pampas gaúchos,
No sul da nossa nação.
Lá numa grande fazenda
Vivia, então, escravizado,
Um menino bem ativo,
Aos cavalos dedicado.
Tratava dos animais
Dum jeito que não era tratado.
Sim, amor demais ele dava
Para aqueles animais,
Mas nunca recebeu amor,
Nunca conheceu a paz,
Só trabalho - era sua vida,
Sem brinquedo ou amor dos pais.
Nesse tempos de escravismo,
Sendo uma criança escrava,
Você era, então, vendido
Seu “dono” lhe separava
Da família original,
De quem você mal lembrava.
Esse menino, então,
Numa fazenda foi morar.
Acordava muito cedo
E começava a trabalhar
Dando àqueles animais
Um afeto exemplar.
Mesmo assim, o fazendeiro
Nunca lhe tratou direito.
Por qualquer coisa o açoitava,
Num completo desrespeito.
Fingia não ver que o menino
Fazia um trabalho perfeito.
Os donos de escravos eram
Ruins, sádicos demais.
Pareciam se divertir
Com aqueles gemidos e ais
De muitos cuja liberdade
Não alcançaram jamais.
Foi um dia e o menino,
Que os cavalos pastorava,
Não viu que o preferido
Do dono se afastava:
É que o meninozinho
Muito cansado estava.
O capataz foi depressa
Falar para o fazendeiro
Que o seu bicho preferido,
O seu cavalo primeiro,
Estava perdido nos pampas,
Solto, sem paradeiro.
O fazendeiro mandou trazer
O negrinho do pastoreio
Pra “lhe dar uma lição,
Pra cuidar do bem alheio”.
O menino chegou e ele disse:
“Você vai fazer um passeio.”
Não, não era passeio,
Era um castigo traiçoeiro:
O menino, amarrado
Num enorme formigueiro,
Pra passar a noite toda
Torturado e prisioneiro.
Quando o dia amanheceu
O fazendeiro foi lá ver
O triste fim do menino
Que estaria a morrer.
Mas, para sua surpresa,
O que viu não pôde crer.
O negrinho do pastoreio
Já não estava lá só:
Montado num cavalo baio
E seis cavalos ao redor.
Nossa Senhora ao seu lado
Era a surpresa maior.
O fazendeiro, assustado,
Correu até o casarão.
E o Negrinho galopou
Dos Pampas até o sertão,
Passando a guiar pessoas
Fugidas da escravidão.
Animais que estão perdidos
Ele ajuda a encontrar.
E também os objetos
Que alguém está a procurar.
Os gaúchos inda hoje
Costumam vê-lo por lá.
Essa é só uma das tantas
Histórias da escravidão
Que aconteceram no Brasil
Do litoral ao sertão,
Dos Pampas ao Amazonas,
E em toda nossa nação.
É uma tristeza que um dia
Tanto mal tenha existido
Em nosso e em outros países,
Que pessoas tenham sofrido
Violências e abusos
E milhões tenham morrido.
Que essas memórias tristes
Ensinem uma grande verdade:
De não tratar nunca mais
Ninguém como propriedade
De qualquer outra que seja.
Viva, enfim, a liberdade.