segunda-feira, 20 de março de 2023

Lima Barreto, trecho de Triste fim de Policarpo Quaresma e questões sobre o Pré-Modernismo

 


Nos dias atuais, Lima Barreto (1881-1922) é unanimemente reconhecido como um dos nossos maiores escritores. Mas, em sua época, Afonso Henriques de Lima Barreto sofreu duramente o preconceito racial.

Sua obra-prima é o romance Triste fim de Policarpo Quaresma (1911).

Abaixo, temos um trecho do capítulo III da segunda parte de Triste fim...

No trecho, o major Quaresma recebe a visita da afilhada Olga, de seu esposo, e do violonista Ricardo Coração dos Outros, amigo e professor de violão de Quaresma.

Olga voltava de um passeio ao Carico, onde havia uma cachoeira, a duas léguas do sítio do padrinho.

[...]

O que mais a impressionou no passeio foi a miséria geral, a falta de cultivo, a pobreza das casas, o ar triste, abatido da gente pobre. Educada na cidade, ela tinha dos roceiros ideia de que eram felizes, saudáveis e alegres. Havendo tanto barro, tanta água, por que as casas não eram de tijolos e não tinham telhas? Era sempre aquele sapê sinistro e aquele "sopapo" que deixava ver a trama de varas, como o esqueleto de um doente. Por que, ao redor dessas casas, não havia culturas, uma horta, um pomar? Não seria tão fácil, trabalho de horas?
E não havia gado, nem grande nem pequeno. Era raro uma cabra, um carneiro. Por quê? Mesmo nas fazendas, o espetáculo não era mais animador. Todas soturnas, baixas, quase sem o pomar olente e a horta suculenta. A não ser o café e um milharal, aqui e ali, ela não pôde ver outra lavoura, outra indústria agrícola. Não podia ser preguiça só ou indolência. Para o seu gasto, para uso próprio, o homem tem sempre energia para trabalhar. As populações mais acusadas de preguiça, trabalham relativamente. Na África, na Índia, na Cochinchina, em toda parte, os casais, as famílias, as tribos, plantam um pouco, algumas coisas para eles. Seria a terra? Que seria? E todas essas questões desafiavam a sua curiosidade, o seu desejo de saber, e também a sua piedade e simpatia por aqueles párias,
maltrapilhos, mal alojados, talvez com fome, sorumbáticos!…

Pensou em ser homem. Se o fosse passaria ali e em outras localidades meses e anos, indagaria, observaria e com certeza havia de encontrar o motivo e o remédio. [...]

Como no dia seguinte fosse passear ao roçado do padrinho, aproveitou a ocasião para interrogar a respeito o tagarela Felizardo. [...]

— Bons dias, "sá dona".

— Então trabalha-se muito, Felizardo?

— O que se pode.

— Estive ontem no Carico, bonito lugar… Onde é que você mora, Felizardo?

— É doutra banda, na estrada da vila.

— É grande o sítio de você?

— Tem alguma terra, sim senhora, "sá dona".

— Você por que não planta para você?

— "Quá sá dona!" O que é que a gente come?

— O que plantar ou aquilo que a plantação der em dinheiro.

— "Sá dona tá" pensando uma coisa e a coisa é outra. Enquanto planta cresce, e então? "Quá, sá dona", não é assim.

Deu uma machadada; o tronco escapou: colocou-o melhor no picador e, antes de desferir o machado, ainda disse:

— Terra não é nossa… E "frumiga"?… Nós não "tem" ferramenta… isso é bom para italiano ou "alamão", que governo dá tudo… Governo não gosta de nós…

Desferiu o machado, firme, seguro; e o rugoso tronco se abriu em duas partes, quase iguais, de um claro amarelado, onde o cerne escuro começava a aparecer.

Ela voltou querendo afastar do espírito aquele desacordo que o camarada indicara, mas não pôde. Era certo. Pela primeira vez notava que o self-help do Governo era só para os nacionais; para os outros todos os auxílios e facilidades, não contando com a sua anterior educação e apoio dos patrícios.

E a terra não era dele? Mas de quem era então, tanta terra abandonada que se encontrava por aí? Ela vira até fazendas fechadas, com as casas em ruínas… Por que esse acaparamento, esses latifúndios inúteis e improdutivos?

A fraqueza de atenção não lhe permitiu pensar mais no problema. Foi vindo para casa, tanto mais que era hora de jantar e a fome lhe chegava.

Encontrou o marido e o padrinho a conversar. Aquele perdera um pouco da sua morgue, havia mesmo ocasião em que era até natural. Quando ela chegou, o padrinho exclamava:

— Adubos! É lá possível que um brasileiro tenha tal ideia! Pois se temos as terras mais férteis do mundo!

— Mas se esgotam, major, observou o doutor.

Dona Adelaide, calada, seguia com atenção o crochet que estava fazendo; Ricardo ouvia, com os olhos arregalados; e Olga intrometeu-se na conversa:

— Que zanga é essa, padrinho?

— É teu marido que quer convencer-me que as nossas terras precisam de adubos… Isto é até uma injúria!

— Pois fique certo, major, se eu fosse o senhor, aduziu o doutor, ensaiava uns fosfatos…

— Decerto, major, obtemperou Ricardo. Eu, quando comecei a tocar violão, não queria aprender música… Qual música! Qual nada!
A inspiração basta!… Hoje vejo que é preciso… É assim, resumia ele.

Todos se entreolharam, exceto Quaresma que logo disse com toda a força d’alma:

— Senhor doutor, o Brasil é o país mais fértil do mundo, é o mais bem dotado e as suas terras não precisam "empréstimos" para dar sustento ao homem. Fique certo!

— Há mais férteis, avançou o doutor.

— Onde?

— Na Europa.

— Na Europa!

— Sim, na Europa. As terras negras da Rússia, por exemplo.

O major considerou o rapaz durante algum tempo e exclamou triunfante:

— O senhor não é patriota! Esses moços…

O jantar correu mais calmo. Ricardo fez ainda algumas considerações sobre o violão. À noite, o menestrel cantou a sua última produção: "Os Lábios da Carola". [...] Olga tocou no velho piano de Dona Adelaide; e, antes das onze horas, estavam todos recolhidos.

Quaresma chegou a seu quarto, despiu-se, enfiou a camisa de dormir e, deitado, pôs-se a ler um velho elogio das riquezas e opulências do Brasil.

A casa estava em silêncio; do lado de fora, não havia a mínima bulha. Os sapos tinham suspendido um instante a sua orquestra noturna. Quaresma lia; e lembrava-se que Darwin escutava com prazer esse concerto dos charcos.
Tudo na nossa terra é extraordinário! pensou. Da despensa, que ficava junto a seu aposento, vinha um ruído estranho. Apurou o ouvido e prestou atenção. Os sapos recomeçaram o seu hino. Havia vozes baixas, outras mais altas e estridentes; uma se seguia à outra, num dado instante todas se juntaram num uníssono sustentado. Suspenderam um instante a música. O major apurou o ouvido; o ruído continuava,
Que era? Eram uns estalos tênues; parecia que quebravam gravetos, que deixavam outros cair no chão… Os sapos recomeçaram; o regente deu uma martelada e logo vieram os baixos e os tenores. Demoraram muito; Quaresma pôde ler umas cinco páginas. Os batráquios pararam; a bulha continuava. O major levantou-se, agarrou o castiçal e foi à dependência da casa donde partia o ruído, assim mesmo como estava, em camisa de dormir.

Abriu a porta; nada viu. la procurar nos cantos, quando sentiu uma ferroada no peito do pé. Quase gritou. Abaixou a vela para ver melhor e deu com uma enorme saúva agarrada com toda a fúria à sua pele magra. Descobriu a origem da bulha. Eram formigas que, por um buraco no assoalho, lhe tinham invadido a despensa e carregavam as suas reservas
de milho e feijão, cujos recipientes tinham sido deixados abertos por inadvertência. O chão estava negro, e carregadas com os grãos, elas, em pelotões cerrados, mergulhavam no solo em busca da sua cidade subterrânea.

Quis afugentá-las. Matou uma, duas, dez, vinte, cem; mas eram milhares e cada vez mais o exército aumentava. Veio uma, mordeu-o, depois outra, e o foram mordendo pelas pernas, pelos pés, subindo pelo seu corpo.
Não pôde aguentar, gritou, sapateou e deixou a vela cair.

Estava no escuro. Debatia-se para encontrar a porta; achou e correu daquele ínfimo inimigo que, talvez, nem mesmo à luz radiante do sol o visse distintamente…

 

 

Refletindo sobre...

Completando o estudo do Pré-Modernismo, preparei algumas questões básicas:

 

1) Assinale V (verdadeiro) ou F (falso) para cada uma das afirmações abaixo:

a) O livro Eu, de Augusto dos Anjos, é, provavelmente, a obra de poesia mais lida em nosso país. ( )

b) No livro de contos Urupês, Monteiro Lobato retrata o impacto social provocado pelo declínio da cultura do café no interior de São Paulo. ( )

c) O Pré-Modernismo é um movimento literário criado pelos escritores Euclides da Cunha, Monteiro Lobato e Lima Barreto. ( )

d) Segundo Augusto dos Anjos, Carlos Drummond de Andrade “continua sendo o grande caso singular da poesia brasileira”. ( )

e) Na poesia, temos dois grandes representantes do Pré-Modernismo: Augusto dos Anjos e Carlos Drummond de Andrade. ( )

f) O reflorescimento do nacionalismo e a busca de uma língua brasileira, mais próxima do povo, são duas das mudanças observadas na literatura brasileira do início do século XX. ( )

g) Entre os principais representantes do Pré-Modernismo na prosa, temos: Euclides da Cunha, Monteiro Lobato e Lima Barreto. ( )

h) Em seu livro Os sertões (1902), Euclides da Cunha confirmou a versão do exército brasileiro sobre a origem da guerra de Canudos: a necessidade de combater um foco monarquista que se opunha à recente República. ( )

i) Lima Barreto foi um dos primeiros escritores a retratar as camadas mais humildes da população brasileira. ( )

j) Costuma-se chamar Pré-Modernismo à produção literária situada entre 1900 e 1922. ( )

2)

A lágrima

Augusto dos Anjos

– Faça-me o obséquio de trazer reunidos
Cloreto de sódio, água e albumina…
Ah! Basta isto, porque isto é que origina
A lágrima de todos os vencidos!

 

-“A farmacologia e a medicina
Com a relatividade dos sentidos
Desconhecem os mil desconhecidos
Segredos dessa secreção divina”.

 

– O farmacêutico me obtemperou. –
Vem-me então à lembrança o pai Yoyô
Na ânsia física da última eficácia…

 

E logo a lágrima em meus olhos cai.

Ah! Vale mais lembrar-me eu de meu Pai
Do que todas as drogas da farmácia!

A respeito do poema, é incorreto afirmar:

a) Na última estrofe, o eu lírico questiona a eficácia da farmacologia e da medicina.

b) Além de consequência das aliterações presentes, a musicalidade do verso “Na ânsia física da última eficácia” é resultante principalmente da assonância dos fonemas /a/ e /i/.

c) A forma poética empregada pelo poeta - soneto com versos decassílabos - é bastante original para a época.

d) Na segunda estrofe, a fala do farmacêutico contesta a explicação simplista da lágrima a partir de sua composição química.

e) Apresenta elementos científicos, que é uma das características da poesia de Augusto dos Anjos.

 

3) Sobre o conto O homem que sabia javanês, assinale V (verdadeiro) ou F (falso) para cada uma das afirmações abaixo:

a) O conto critica a superficialidade das relações sociais, baseadas em supostos títulos acadêmicos e apadrinhamentos políticos. ( )

b) Um exemplo do apadrinhamento político apresentado no conto é a forma como o protagonista ingressa na diplomacia, a partir de uma solicitação feita ao Visconde de Caruru. ( )

c) O conto termina com o protagonista tornando-se um eminente bacteriologista. ( )

 

4) Com quais das manifestações literárias do século XIX, Triste fim de Policarpo Quaresma está mais alinhado?

( ) Romantismo ( ) Realismo

( ) Parnasianismo ( ) Simbolismo

Por quê?

 

 

quinta-feira, 10 de setembro de 2020

Comparatives and superlatives




Orientações:


Hello, my dear students!



Preparei um resumo para que vocês, meus queridos alunos e alunas da 2ª Série, entendam o uso do comparativo e do superlativo em inglês. O assunto está presente no capítulo 2, nas páginas 82 a 85, em forma de exercício em que se comparam obras de arte. 


 

Comparativos e superlativos


Comparativos

 

Adjetivos curtos recebem a terminação -er e se completam com o uso do comparativo than. 

This house is bigger than the other one.

Esta casa é maior do que a outra.

Today is colder than yesterday.

Hoje faz mais frio do que ontem.

She’s brighter than her brother.

Ela é mais esperta do que seu irmão.

Há um segundo grupo, de palavras mais compridas. Elas usam “mais que” – more than. 

This test is more difficult than the last. 

Esta prova está mais difícil do que a última. 

He is more arrogant than his father. 

Ele é mais arrogante do que o pai dele. O

This film is more interesting than last week. 

Este filme é mais interessante do que o da semana passada. 

Superlativos

 

Os adjetivos neste grupo recebem a terminação -est. Normalmente utilizamos o artigo definido, já que são identificados e únicos. 

This is the biggest house here. 

Esta casa é a maior daqui. 

Today is the coldest day of the year.

Hoje é o dia mais frio do ano.

No segundo grupo, de palavras mais compridas, usamos “o mais” – the most.

This is the most difficult test.

Esta prova é a mais difícil.

He is the most arrogant person I know.

Ele é a pessoa mais arrogante que eu conheço.


Exercício 


1) Forme os comparativos para os seguintes adjetivos.

a) tall – taller____________

b) young – _________________________

c) beautiful – _______________________

d) interesting – _____________________

e) happy – _________________________

f) difficult – ________________________

g) fat – ____________________________

h) long – __________________________

i) old – ____________________________

j) boring – _________________________

k) annoying – ______________________


2) Preencha os espaços com a forma adequada do comparativo.


taller – smaller – faster – older – more difficult – longer


a) A mouse is smaller_____________ than an elephant.

b) The dolphin swims ________________ than a man.

c) Statistically, women live _______________ than men.

d) John is ______________________ than Harry.

e) The London Underground is ___________________ than the Metro in São Paulo.

f) Learning Chinese is _______________________ than English.

3. Forme os superlativos.

a) the tallest______________

b) good – __________________________

c) beautiful – _______________________

d) less – ___________________________

e) happy – _________________________

f) difficult – ________________________

g) fat – ____________________________

h) long – __________________________

i) old – ____________________________

j) bad – ___________________________

k) intelligent – ______________________




Referências:


TUNWELL, Chris, ACUNÃ, Fernando. Aprenda Inglês. São Paulo: Universo dos Livros, 2009.


No YouTube:

https://m.youtube.com/watch?v=0l_zGoyssgw&t=7s



Bye bye!



See you later!


quarta-feira, 9 de setembro de 2020

Dissertação: da pesquisa do tema à escrita do texto

 



Olá, queridos alunos e alunas da 3ª Série!


Leiam o esquema abaixo, síntese da Sequência Didática “Da pesquisa do tema à escrita da redação”.

O objetivo agora é transformar, de fato, pesquisa, anotações, reflexões sobre um determinado tema (que eu suponho que vocês tenham feito, óbvio), em uma dissertação bem redigida. Como dica, leiam a redação de Daniel Gomes, de Fortaleza, que recebeu nota 1000 no Enem 2019 (ver link no final do texto). 


Para redigir bem, é preciso:

* Domínio do português

* Conhecimento do tema

* Conhecimento da estrutura de uma redação


Como montar a estrutura?

– Introdução (um parágrafo)

– Desenvolvimento (dois parágrafos)

– Conclusão (um parágrafo)


* Introdução (1º parágrafo):

– Apresenta a tese (ideia principal);

– Apresenta dois argumentos; 

– Utilizar expressões como: “No que concerne…”; “É notório…”; “No que se refere…”, etc.


* Desenvolvimento (parágrafos 2 e 3):

– Parágrafo 2: desenvolvimento do Argumento 1;

– Parágrafo 3: desenvolvimento do Argumento 2.


* Conclusão:

– Parágrafo 4: – retomada e confirmação da tese; – apresentação de uma solução ou proposta de intervenção para o problema analisado (que respeite os direitos humanos). 

Importante!

Ligue a Tese e os Argumentos por meio de conjunções: já que, visto que, diante disso, dentre outros fatores, etc. 

Para ligar um parágrafo a outro, use conectores: ademais (ideia de adição), além disso (ideia de adição), entretanto (ideia de contradição), embora (ideia de concessão), certamente (ideia de certeza), etc. 

Para defender seus argumentos, pode usar: citações ou opiniões de autoridades, acontecimentos ou fatos históricos, notícias, dados estatísticos, etc. 

Algumas das conjunções conclusivas que podem ser usadas no parágrafo final: dessa forma, portanto, sendo assim, etc. 


Agora, junte os dados de sua pesquisa e as observações que você anotou e redija uma dissertação argumentativa sobre o tema pesquisado por você.

O prazo de entrega é: até 25/09/2020. 


Link útil:
Redação Nota 1000: 
http://cema-pioxii.blogspot.com/2020/03/o-que-e-uma-redacao-nota-1000.html?m=1

terça-feira, 8 de setembro de 2020

Desenhando a redação

 


Olá, pessoal.

E aí, pesquisaram sobre temas relevantes? Refletiram sobre eles? Anotaram e desenvolveram essas reflexões? Pois, então, chegou a hora de escrever sua dissertação argumentativa.

A dissertação apresenta uma estrutura a quem, provavelmente, vocês já foram apresentados durante sua formação escolar.

Essa estrutura consiste em: introdução, desenvolvimento e conclusão.

Escolhi um vídeo, disponível no YouTube, que desenha essa estrutura e mostra, em menos de sete minutos, como escrever uma boa dissertação.

Assistam ao vídeo e se preparem para a tarefa final: a partir de um tema pesquisado por você, escreva uma dissertação argumentativa que tenha entre 20 e 30 linhas.

Abaixo o link do vídeo:

https://m.youtube.com/watch?v=dQUfpQOoUxs


quinta-feira, 27 de agosto de 2020

O romance regional: Inocência, de Visconde de Taunay

Fernanda Torres, em início de carreira, interpretou Inocência na versão para o cinema. 


Queridos e queridas alunos da 2ª Série, vamos estudar a origem do romance regional e a sua principal expressão romântica: o romance Inocência, de Visconde de Taunay.


O romance regional
Inocência, de Visconde de Taunay

A perspectiva nacionalista levou alguns escritores do Romantismo a retratar tradições culturais, paisagens, costumes, modismos, valores e expressões linguísticas de diferentes regiões do Brasil.
Entre esses escritores, estão José de Alencar, com a obra O gaúcho (1870), Visconde de Taunay, com Inocência (1872), Bernardo Guimarães, com A escrava Isaura (1875) e Franklin Távora com O Cabeleira (1876).
A obra de Taunay se distingue pela sobriedade: as personagens são menos idealizadas, os diálogos são naturais e espontâneos e a paisagem é retratada sem excessos.
Inocência narra a história de amor (impossível) entre uma jovem do sertão de Mato Grosso e Cirino, um prático de farmácia que se apresentava como médico. No entanto, Pereira, pai de Inocência, havia prometido a filha em casamento a Manecão Doca, um vaqueiro endinheirado.
Pereira vigia constantemente a filha, temendo que Inocência perca a virgindade antes do casamento, o que, sob o ponto de vista dele, seria uma desonra para a família.
Paralelamente à trama amorosa, o naturalista Meyer, um alemão colecionador de borboletas, hospeda-se na casa de Pereira, revelando o choque de valores de pessoas de origens e culturas diferentes.


Fonte: CEREJA, William, DIAS Vianna, Carolina, DAMIEN, Christiane. Português contemporâneo: diálogo, reflexão e uso. São Paulo: Saraiva, 2016. P. 105.


Leia o capítulo XII de Inocência no seu livro didático.
Assista ao filme adaptado da obra, no YouTube: https://m.youtube.com/watch?v=otj0K1G06wA

Refletindo sobre as literaturas africanas de língua portuguesa


Queridos alunos e alunas da 3ª Série: algumas questões para continuarmos refletindo sobre as literaturas africanas de língua portuguesa.



Literaturas africanas de língua portuguesa
Professor Gilcênio 


1. “As manifestações literárias em Angola, Moçambique, Cabo-Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e príncipe tiveram início graças à influência de Portugal.” Como essa afirmação pode ser contestada?

2. Que fase da evolução das literaturas africanas de língua portuguesa foi influenciada pela Revolução dos Cravos e de que maneira pode ter se dado essa influência?

3. Em que fase da evolução das literaturas africanas de língua portuguesa pode ser enquadrada a obra de Ondjaki?

4. “Por intertextualidade entende-se a criação de um texto a partir de outro existente” (Wikipédia). Explique o conto “Nós choramos pelo cão tinhoso” a partir do conceito de intertextualidade.

5. Pesquise sobre a obra de alguns dos autores mencionados (ver lista, por países, na página 300 do seu livro didático de Língua Portuguesa), escolha um poema e crie um podcast, o qual deve incluir a leitura de parte do texto ou do texto todo,  acompanhada de reflexões críticas feitas por você.


Prazo: 04/09/2020. 

sexta-feira, 27 de março de 2020

O que é uma "Redação nota 1000"?



Nessa postagem, vamos começar a analisar que redações merecem nota 1000 no Enem.
A primeira redação analisada é de Daniel Gomes, de Fortaleza, Ceará, que obteve nota 1000 no Enem 2019.
Na caixa de comentários, expressem os conhecimentos prévios de vocês sobre o assunto, respondendo aos seguintes questionamentos: você acha que a redação mereceu nota 1000? Que elementos, características, competências desenvolvidas, permitiram a obtenção da nota máxima?

Redação Nota 1000 – Enem 2019

Daniel Gomes, de Fortaleza

"O filme ‘’Cine Hollywood’’ narra a chegada da primeira sala de cinema na cidade de Crato, interior do Ceará. Na obra, os moradores do até então vilarejo nordestino têm suas vidas modificadas pela modernidade que, naquele contexto, se traduzia na exibição de obras cinematográficas. De maneira análoga à história fictícia, a questão da democratização do acesso ao cinema, no Brasil, ainda enfrenta problemas no que diz respeito à exclusão da parcela socialmente vulnerável da sociedade. Assim, é lícito afirmar que a postura do Estado em relação à cultura e a negligência de parte das empresas que trabalham com a ‘’sétima arte’’ contribuem para a perpetuação desse cenário negativo.
Em primeiro plano, evidencia-se, por parte do Estado, a ausência de políticas públicas suficientemente efetivas para democratizar o acesso ao cinema no país. Essa lógica é comprovada pelo papel passivo que o Ministério da Cultura exerce na administração do país. Instituído para ser um órgão que promova a aproximação de brasileiros a bens culturais, tal ministério ignora ações que poderiam, potencialmente, fomentar o contato de classes pouco privilegiadas ao mundo dos filmes, como a distribuição de ingressos em instituições públicas de ensino básico e passeios escolares a salas de cinema. Desse modo, o Governo atua como agente perpetuador do processo de exclusão da população mais pobre a esse tipo de entretenimento. Logo, é substancial a mudança desse quadro.
Outrossim, é imperativo pontuar que a negligência de empresas do setor – como produtoras, distribuidoras de filmes e cinemas – também colabora para a dificuldade em democratizar o acesso ao cinema no Brasil. Isso decorre, principalmente, da postura capitalista de grande parte do empresariado desse segmento, que prioriza os ganhos financeiros em detrimento do impacto cultural que o cinema pode exercer sobre uma comunidade. Nesse sentido, há, de fato, uma visão elitista advinda dos donos de salas de exibição, que muitas vezes precificam ingressos com valores acima do que classes populares podem pagar. Consequentemente, a população de baixa renda fica impedida de frequentar esses espaços. É necessário, portanto, que medidas sejam tomadas para facilitar o acesso democrático ao cinema no país. Posto isso, o Ministério da Cultura deve, por meio de um amplo debate entre Estado, sociedade civil, Agência Nacional de Cinema (ANCINE) e profissionais da área, lançar um Plano Nacional de Democratização ao Cinema no Brasil, a fim de fazer com que o maior número possível de brasileiros possa desfrutar do universo dos filmes. Tal plano deverá focar, principalmente, em destinar certo percentual de ingressos para pessoas de baixa renda e estudantes de escolas públicas. Ademais, o Governo Federal deve também, mediante oferecimento de incentivos fiscais, incentivar os cinemas a reduzirem o custo de seus ingressos. Dessa maneira, a situação vivenciada em ‘’Cine Hollywood’’ poderá ser visualizada na realidade de mais brasileiros." 



Estudando na Quarentena



Boa tarde, meus queridos, minhas queridas. Ah, que saudade de vocês...
Mas, nesse momento, completamente inédito da história mundial, precisamos ficar em casa, solidários e unidos à distância, virtualmente, dos nossos aparelhinhos, tablets, notebooks...
Para que mantenhamos nossas mentes ocupadas com coisas interessantes, efetivamente relevantes, passo, a partir de hoje, a compartilhar com vocês conteúdos originais de língua portuguesa e língua inglesa. Sem desprezar, é claro, contribuições e conteúdos já disponíveis na web, os quais, os mais adequados, serão devidamente integrados às nossas postagens.
Acessem textos, vídeos, áudios, imagens, gráficos, respondam aos questionamentos, façam comentários ao final das postagens, deem sugestões, coloquem questões pertinentes que ajudem a aperfeiçoar o processo coletivo de compreensão e aprendizagem.
Um forte abraço. Rumbora? See you soon. Hasta la vista. 

segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Soneto do Dia dos Professores do ano de 2018



Sou professor e ensino esperança.
O diálogo é minha metodologia.
Ver a imperfeição, é a filosofia
Que me explica o adulto e a criança.

Contradições e pedras no caminho
Sempre existiram e hão de existir.
À insensatez vamos resistir
(Pois, nessa luta, não estou sozinho).

O ódio, a ignorância, a mentira
Não apagam as palavras e a lira
De Castro Alves, de Cruz e Sousa.

De Noémia, Graciliano Ramos
E milhares de mestres que amamos:
A humanidade é nossa grande lousa.

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Capitu: culpada ou inocente?




Selecionei trechos da obra que ajudam (espero) a responder a pergunta: Capitu traiu Bentinho?

José Dias, o agregado, para D. Glória, mãe de Bentinho (CAP. III):
D. Glória, a senhora persiste na idéia de meter o nosso Bentinho no seminário? É mais que tempo, e já agora pode haver uma dificuldade. […] Não me parece bonito que o nosso Bentinho ande metido nos cantos com a filha do Tartaruga, e esta é a dificuldade, porque se eles pegam de namoro, a senhora terá muito que lutar para separá-los.
- […] Em segredinhos, sempre juntos. Bentinho quase não sai de lá. A pequena é uma desmiolada; o pai faz que não vê. - Mas, Sr. José Dias, tenho visto os pequenos brincando, e nunca vi nada que faça desconfiar. Basta a idade; Bentinho mal tem quinze anos. Capitu fez quatorze à semana passada; são dois criançolas. Não se esqueça que foram criados juntos, desde aquela grande enchente, há dez anos, em que a família Pádua perdeu tanta coisa. [...]

Bentinho, sobre ele e Capitu, quando crianças (CAP. XI):
Em casa, brincava de missa, — um tanto às escondidas, porque minha mãe dizia que missa não era coisa de brincadeira. Arranjávamos um altar, Capitu e eu. Ela servia de sacristão, e alterávamos o ritual, no sentido de dividirmos a hóstia entre nós; a hóstia era sempre um doce.

Bentinho, sobre ele e Capitu, quando adolescentes (CAP. XIII):
Capitu chamava-me às vezes bonito, mocetão, uma flor; outras pegava-me nas mãos para contar-me os dedos. E comecei a recordar esses e outros gestos e palavras, o prazer que sentia quando ela me passava a mão pelos cabelos, dizendo que os achava lindíssimos. Eu, sem fazer o mesmo aos dela, dizia que os dela eram muito mais lindos que os meus.

Quando me perguntava se sonhara com ela na véspera, e eu dizia que não, ouvia-lhe contar que sonhara comigo, e eram aventuras extraordinárias, que subíamos ao Corcovado pelo ar, que dançávamos na Lua, ou então que os anjos vinham perguntar-nos pelos nomes, a fim de os dar a outros anjos que acabavam de nascer. Em todos esses sonhos andávamos unidinhos. Os que eu tinha com ela não eram assim […].

Pádua, pai de Capitu, sobre a filha (CAP. XVI):
Quem dirá que esta pequena tem quatorze anos? Parece dezessete.

Bentinho, falando para Capitu, que D. Glória insiste em mandá-lo ao seminário (CAP. XIX):
[…] Capitu queria saber que notícia era a que me afligia tanto. Quando lhe disse o que era, fez-se cor de cera.
Mas eu não quero, acudi logo, não quero entrar em seminários; não entro, é escusado teimarem comigo; não entro.
Capitu, a princípio, não disse nada.

[…] Enfim, tornou a si, mas tinha a cara lívida, e rompeu nestas palavras furiosas:
Beata! carola! papa-missas!
Fiquei aturdido. Capitu gostava tanto de minha mãe, e minha mãe dela, que eu não podia entender tamanha explosão.

[…] Quis defendê-la, mas Capitu não me deixou, continuou a chamar-lhe beata e carola, em voz tão alta que tive medo fosse ouvida dos pais. Nunca a vi tão irritada como então; parecia disposta a dizer tudo a todos. Cerrava os dentes, abanava a cabeça... Eu, assustado, não sabia que fizesse; repetia os juramentos, prometia ir naquela mesma noite declarar em casa que, por nada neste mundo, entraria no seminário.

[…] confessou que certamente não era por mal que minha mãe me queria fazer padre; era a promessa antiga, que ela, temente a Deus, não podia deixar de cumprir. Fiquei tão satisfeito de ver que assim espontaneamente reparava as injúrias que lhe saíram do peito, pouco antes, que peguei da mão dela e apertei-a muito. Capitu deixou-se ir, rindo […].

José Dias, para Bentinho, sobre Capitu (CAP. XXII):
[…] A gente Pádua não é de todo má. Capitu, apesar daqueles olhos que o Diabo lhe deu... Você já reparou nos olhos dela? São assim de cigana oblíqua e dissimulada.

Capitu e Bentinho depois do primeiro beijo (CAP. XXXIV):
Ouvimos passos no corredor; era D. Fortunata. Capitu compôs-se depressa, tão depressa que, quando a mãe apontou à porta, ela abanava a cabeça e ria. [...]
Mamãe, olhe como este senhor cabeleireiro me penteou; pediu-me para acabar o penteado, e fez isto. Veja que tranças!


Bentinho, recordando o beijo (CAP. XXXIV):
Corri ao meu quarto, peguei dos livros, mas não passei à sala da lição; sentei-me na cama, recordando o penteado e o resto. […]
Sou homem!

Capitu e Bentinho juram que irão se casar um com o outro (CAP. XLVIII):
Ainda que você case com outra, cumprirei o meu juramento, não casando nunca.
Que eu case com outra?
Tudo pode ser, Bentinho. Você pode achar outra moça que lhe queira, apaixonar-se por ela e casar. Quem sou eu para você lembrar-se de mim nessa ocasião?
Mas eu também juro! Juro, Capitu, juro por Deus Nosso Senhor que só me casarei com você. Basta isto?
Devia bastar, disse ela; eu não me atrevo a pedir mais. Sim, você jura... Mas juremos por outro modo; juremos que nos havemos de casar um com outro, haja o que houver.

Bentinho vai para o seminário (CAP. LI):
Meses depois fui para o seminário de São José. Se eu pudesse contar as lágrimas que chorei na véspera e na manhã, somaria mais que todas as vertidas desde Adão e Eva.

Bentinho conhece Escobar no seminário (CAP. LVII):
Chamava-se Ezequiel de Sousa Escobar. Era um rapaz esbelto, olhos claros […].
Era mais velho que eu três anos, filho de um advogado de Curitiba […]

Escobar veio abrindo a alma toda, desde a porta da rua até ao fundo do quintal. […]
Não sei o que era a minha. Eu não era ainda casmurro […] mas como as portas não tinham chaves nem fechaduras, bastava empurrá-las, e Escobar empurrou-as e entrou. Cá o achei dentro, cá ficou, até que...

Bentinho tem uma crise de ciúmes de Capitu (CAP. LXXIII):
Assim se explicam a minha estada debaixo da janela de Capitu e a passagem de um cavaleiro, um dandi, como então dizíamos. Montava um belo cavalo alazão, firme na sela, rédea na mão esquerda, a direita à cinta, botas de verniz, figura e postura esbelta […].

Ora, o dandi do cavalo baio não passou como os outros […]. O cavaleiro não se contentou de ir andando, mas voltou a cabeça para o nosso lado, o lado de Capitu, e olhou para Capitu, e Capitu para ele; o cavalo andava, a cabeça do homem deixava-se ir voltando para trás. Tal foi o segundo dente de ciúme que me mordeu. Vão lá raciocinar com um coração de brasa, como era o meu! Nem disse nada a Capitu; saí da rua à pressa [...].

Depois de sair do seminário, Bentinho se forma em Direito (passam-se cinco anos) (CAP. XCVIII):
Passei os dezoito anos, os dezenove, os vinte, os vinte e um; aos vinte e dois era bacharel em Direito.
Tudo mudara em volta de mim. Minha mãe resolvera-se a envelhecer […].
Escobar começava a negociar em café […].
Ele casou, — adivinha com quem, — casou com a boa Sancha, a amiga de Capitu, quase irmã dela, tanto que alguma vez, escrevendo-me, chamava a esta a "sua cunhadinha".

O casamento de Bentinho e Capitu (CAP. CI):
[…] Casemo-nos. Foi em 1865, uma tarde de março, por sinal que chovia. Quando chegamos ao alto da Tijuca, onde era o nosso ninho de noivos, o céu recolheu a chuva e acendeu as estrelas […].

Bentinho sobre o casal Sancha e Escobar (CAP. CIV):
Sancha e Capitu continuavam depois de casadas a amizade da escola, Escobar e eu a do seminário.
Escobar e a mulher viviam felizes; tinham uma filhinha. Em tempo ouvi falar de uma aventura do marido, […] não sei que atriz ou bailarina, mas se foi certo, não deu escândalo.

Bentinho fala a Escobar sobre querer ser pai (CAP. CIV):
Como eu um dia dissesse a Escobar que lastimava não ter um filho, replicou-me:
Homem, deixa lá. Deus os dará quando quiser, e se não der nenhum é que os quer para si, e melhor será que fiquem no Céu.
Uma criança, um filho é o complemento natural da vida.
Virá, se for necessário.
Não vinha. Capitu pedia-o em suas orações, eu mais de uma vez dava por mim a rezar e a pedi-lo.

Bentinho sobre Capitu, depois do casamento (CAP. CV):
Embora gostasse de jóias, como as outras moças, não queria que eu lhe comprasse muitas nem caras. […]
De dançar gostava, e enfeitava-se com amor quando ia a um baile; os braços é que… Eram os mais belos da noite. [...]. Quando vi que os homens não se fartavam de olhar para eles, de os buscar, quase de os pedir, e que roçavam por eles as mangas pretas, fiquei vexado e aborrecido. Ao terceiro [baile] não fui, e aqui tive o apoio de Escobar […].
Sanchinha também não vai, ou irá de mangas compridas.

O nascimento de Ezequiel, filho de Bentinho e Capitu (CAP. CVIII):
A minha alegria quando ele nasceu, não sei dizê-la; nunca a tive igual, nem creio que a possa haver idêntica […].
As horas de maior encanto e mistério eram as de amamentação.

Bentinho descobre no menino Ezequiel o hábito de imitar as pessoas (CAP. CXII):
- […] Eu só lhe descubro um defeitozinho, gosta de imitar os outros.
Imitar como?
Imitar os gestos, os modos, as atitudes; imita prima Justina, imita José Dias; já lhe achei até um jeito dos pés de Escobar e dos olhos...

Bentinho fala sobre seu ciúme (CAP. CXIII):
Cheguei a ter ciúmes de tudo e de todos. Um vizinho, um par de valsa, qualquer homem, moço ou maduro, me enchia de terror ou desconfiança.
[…] Capitu era tudo e mais que tudo; não vivia nem trabalhava que não fosse pensando nela.

Bentinho vai sozinho ao teatro, pois Capitu estava doente. Volta para casa antes da peça terminar e encontra Escobar chegando à sua casa (CAP. CXIII):
[…] Saí, mas voltei no fim do primeiro ato. Encontrei Escobar à porta do corredor.
Vinha falar-te, disse-me ele.

Bentinho comenta sobre a frieza de D. Glória com Capitu e Ezequiel (CAP. CXV):
Disse-lhe que começava a achar minha mãe um tanto fria e arredia com ela. […]
Já disse a você o que é; coisas de sogra. Mamãezinha tem ciúmes de você […].
Mas eu tenho notado que já é fria também com Ezequiel. Quando ele vai comigo, mamãe não lhe faz as mesmas graças.

José Dias revela que D. Glória elogia Capitu (CAP. CXVI):
[…] quando D. Glória elogia a sua nora e comadre...
Então, mamãe?...
Perfeitamente!
Mas, por que é que não nos visita há tanto tempo?
Creio que tem andado mais achacada dos seus reumatismos […].

Capitu não gosta de José Dias referir-se a Ezequiel com a expressão bíblica “filho do homem” (CAP. CXVI):
- […] "Dize-me, filho do homem, onde estão os teus brinquedos?" "Queres comer doce, filho do homem?
Que filho do homem é esse? perguntou-lhe Capitu agastada.
São os modos de dizer da Bíblia.
Pois eu não gosto deles, replicou ela com aspereza.

José Dias pede que Ezequiel o imite, mostrando como ele, José Dias, anda. Capitu não gosta desse costume revelado pelo filho (CAP. CXVI):
Meu anjo, como é que eu ando na rua?
Não, atalhou Capitu; já lhe vou tirando esse costume de imitar os outros.
Mas tem muita graça; […]
Outro dia chegou a fazer um gesto de D. Glória, tão bem que ela lhe deu um beijo em paga. Vamos, como é que eu ando?
Não, Ezequiel, disse eu, mamãe não quer.

Bentinho relata Ezequiel imitando Escobar (CAP. CXVI):
Eu mesmo achava feio tal sestro. Alguns dos gestos já lhe iam ficando mais repetidos, como os das mãos e pés de Escobar; ultimamente, até apanhara o modo de voltar a cabeça deste, quando falava, e o de deixá-la cair, quando ria.

Capitu repreende Ezequiel pela mania de imitar as pessoas (CAP. CXVI):
Mas o menino era travesso, como o diabo; apenas começamos a falar de outra coisa, saltou ao meio da sala, dizendo a José Dias:
O senhor anda assim.
Não podemos deixar de rir, eu mais que ninguém. A primeira pessoa que fechou a cara, que o repreendeu e chamou a si foi Capitu.
Não quero isso, ouviu?

Na casa de Escobar, Bentinho narra jogo de sedução entre ele e Sancha, esposa de Escobar (CAP. CXVIII):
Sancha ergueu a cabeça e olhou para mim com tanto prazer que eu, graças às relações dela e Capitu, não se me daria beijá-la na testa. […]
Quando saímos, tornei a falar com os olhos à dona da casa. A mão dela apertou muito a minha, e demorou-se mais que de costume. […] Senti ainda os dedos de Sancha entre os meus, apertando uns aos outros. Foi um instante de vertigem e de pecado.
Ainda na mesma visita, Bentinho revela inveja dos braços de Escobar (CAP. CXVIII):
Apalpei-lhe os braços, como se fossem os de Sancha. Custa-me esta confissão, mas não posso suprimi-la; era jarretar a verdade. Não só os apalpei com essa ideia, mas ainda senti outra coisa; achei-os mais grossos e fortes que os meus, e tive-lhes inveja […].

Escobar morre afogado (CAP. CXXI):
[…] Ouvi passos precipitados na escada, a campainha soou, soaram palmas, […] acudiram todos, acudi eu mesmo. Era um escravo da casa de Sancha que me chamava:
Para ir lá... sinhô nadando, sinhô morrendo.
[…] Escobar meteu-se a nadar, como usava fazer, arriscou-se um pouco mais fora que de costume, apesar do mar bravio, foi enrolado e morreu. As canoas que acudiram mal puderam trazer-lhe o cadáver.

Bentinho sente ciúmes da forma como Capitu olha para Escobar no caixão (CAP. CXXIII):
[…] Capitu olhou alguns instantes para o cadáver tão fixa, tão apaixonadamente fixa, que não admira lhe saltassem algumas lágrimas poucas e caladas…
As minhas cessaram logo. Fiquei a ver as dela; Capitu enxugou-as depressa […].
Momento houve em que os olhos de Capitu fitaram o defunto, quais os da viúva, sem o pranto nem palavras desta, mas grandes e abertos, como a vaga do mar lá fora, como se quisesse tragar também o nadador da manhã.

Bentinho ressalta ser cada vez mais evidente a semelhança física entre Ezequiel e Escobar (CAP. CXXXII):
Nem só os olhos, mas as restantes feições, a cara, o corpo, a pessoa inteira, iam-se apurando com o tempo.
Escobar vinha assim surgindo da sepultura […] para se sentar comigo à mesa, receber-me na escada, beijar-me no gabinete de manhã, ou pedir-me à noite a bênção do costume.
Quando nem mãe nem filho estavam comigo o meu desespero era grande, e eu jurava matá-los […].

Bentinho vai ao teatro assistir Otelo, peça de Shakespeare cujo tema é o ciúme (CAP. CXXXV):
De noite fui ao teatro. Representava-se justamente Otelo, que eu não vira nem lera nunca; sabia apenas o assunto, e estimei a coincidência. Vi as grandes raivas do mouro, por causa de um lenço, — um simples lenço!— e aqui dou matéria à meditação dos psicólogos deste e de outros continentes, pois não me pude furtar à observação de que um lenço bastou a acender os ciúmes de Otelo e compor a mais sublime tragédia deste mundo.

Bentinho tenta o suicídio, quando chega Ezequiel (CAP. CXXXVI):
O meu plano foi esperar o café, dissolver nele a droga e ingeri-la. […] O copeiro trouxe o café. […] A mão tremeu-me ao abrir o papel em que trazia a droga embrulhada. Ainda assim tive ânimo de despejar a substância na xícara, e comecei a mexer o café […].

Bentinho quase envenena o pequeno Ezequiel (CAP. CXXXVII):
Inclinei-me e perguntei a Ezequiel se já tomara café.
Já, papai; vou à missa com mamãe.
Toma outra xícara, meia xícara só.
E papai?
Eu mando vir mais; anda, bebe!
Ezequiel abriu a boca.
Mas não sei que senti que me fez recuar. Pus a xícara em cima da mesa, e dei por mim a beijar doidamente a cabeça do menino.
Papai! papai! exclamava Ezequiel.
Não, não, eu não sou teu pai!

Bentinho diz a Capitu que Ezequiel não é seu filho (CAP. CXXXVIII):
Capitu recompôs-se; disse ao filho que se fosse embora, e pediu-me que lhe explicasse… […] Sem lhe contar o episódio do café, repeti-lhe as palavras do final do capítulo.
O quê? perguntou ela como se ouvira mal.
Que não é meu filho.

Que é que lhe deu agora tal convicção? Ande, Bentinho, fale! fale! Despeça-me daqui, mas diga tudo primeiro.
Há coisas que se não dizem.
Que se não dizem só metade; mas já que disse metade, diga tudo.

Pedi-lhe ainda uma vez que não teimasse.
Não, Bentinho, ou conte o resto, para que eu me defenda, se você acha que tenho defesa, ou peço-lhe desde já a nossa separação: não posso mais!
Não disse tudo; mas pude aludir aos amores de Escobar sem proferir-lhe o nome.
Pois até os defuntos! Nem os mortos escapam aos seus ciúmes!

Já rapaz e de luto pela morte de Capitu, Ezequiel volta ao Brasil para visitar o pai. Bentinho o acha parecidíssimo com Escobar (CAP. CXLV):
Ao entrar na sala, dei com um rapaz, […] era nem mais nem menos o meu antigo e jovem companheiro do seminário de São José, um pouco mais baixo, menos cheio de corpo e [...] o mesmo rosto do meu amigo. […] Era o próprio, o exato, o verdadeiro Escobar.
Contou-me a vida na Europa, os estudos […]. Não havendo remédio senão ficar com ele, fiz-me pai deveras. […] Ao cabo de seis meses, Ezequiel falou-me em uma viagem à Grécia, ao Egito, e à Palestina, viagem científica […].

A morte de Ezequiel (CAP. CXLVI):
Onze meses depois, Ezequiel morreu de uma febre tifóide, e foi enterrado nas imediações de Jerusalém, onde os dois amigos da universidade lhe levantaram um túmulo com esta inscrição, tirada do profeta Ezequiel, em grego: "Tu eras perfeito nos teus caminhos” [...].

Bentinho reafirma, no último capítulo, a convicção de que foi traído (CAP. CXLVII):
[…] Uma coisa fica, e é a suma das sumas, ou o resto dos restos, a saber, que a minha primeira amiga e o meu maior amigo, tão extremosos ambos e tão queridos também, quis o destino que acabassem juntando-se e enganando-me... A terra lhes seja leve!