Para
Francisco, vida de criança não era nada fácil. Mas será que as
pessoas entendiam isso?
Certa
vez, só por estar bocejando na escola, uma colega de classe o chamou
de dorminhoco e preguiçoso. Mas, por acaso, ela perguntara o que ele
andara fazendo em casa? Não. Ninguém perguntou.
Como
o pai estava longe, trabalhando em Macapá, ele, Francisco, era o
homem da família (tinha também o seu irmãozinho de três anos, mas
como Francisco costumava dizer: "isso lá é gente?"). E
foi assim, com a convicção de que era um grande homem, que
Francisco passou a manhã carregando tijolos, ajudando a mãe, para a
reforma que fariam na casa, esperando o pai para o natal.
Morava
na zona rural, em um pequeno povoado chamado Centro do Meio, na
cidade de Pio XII, no Maranhão. Naquele dia, o carro que
transportava os alunos da zona rural, onde moravam, para a sede do
município, onde estudavam, não apareceu. Então, a maioria ficou em
casa; outros, tentaram alguma carona ou foram de bicicleta.
Francisco
resolveu ir de bicicleta. Podia antes ter olhado as nuvens, como
fazia sua vó, mas não olhou. Pegou chuva, ficou muito ensopado,
aproximou-se da escola, mas parou no meio do caminho: não tinha como
estudar daquele jeito, um verdadeiro pinto molhado (e acabrunhado).
Pretendia
voltar imediatamente para casa, mas encontrou alguns amigos que o
convidaram para jogar bola na rua, debaixo daquela chuva. Foi. Queria
jogar no ataque, mas o escalaram no gol.
Como
não era o dono da bola e como estava em território estranho (não
conhecia direito aqueles lados da cidade), tudo bem, foi para o gol,
mas resmugando.
Tentou
passar confiança para si próprio e para os outros e declarou: "aqui
não passa nem mosquito assado" (era uma frase que já tinha
ouvido em algum lugar).
Porém,
tinha aquele menino, um pingo de gente de uns seis anos, que não
deixava quieta a bicicleta de Francisco.
"Ei!
Deixa essa bicicleta aí", gritou Francisco, mas o garoto
parecia nem ouvir. "O diacho desse menino! Se acontece alguma
coisa com a bicicleta, eu tô lascado", eram esses os
pensamentos de Francisco quando levou um gol por entre as pernas e
sentiu uma multidão de risadas ricocheteando sua cara. Mangavam dele
pra valer!
Deixou
o jogo e foi pra casa. Ao chegar lá, sua mãe já sabia que ele não
tinha aparecido na escola. Francisco contou a história da chuva,
pulou a parte do futebol, não falou mais nada, pois sua mãe não
deixava, reclamando-se da vida, do filho que tinha e dos dias de
hoje, em que os pais não podem mais bater nos filhos, onde já se
viu isso?
Francisco
ouviu calado. Passados alguns minutos, a mãe ordenou que ele fosse
tomar banho imediatamente - e ele foi sem dar um pio, dizer o quê?
Mas,
na hora da janta, a mãe já tinha esquecido tudo e o chamava para
comer. Francisco levou o prato pra frente da televisão. Bem na hora
do noticiário e da previsão do tempo. Para o dia seguinte não
estavam previstas chuvas para o Maranhão. Francisco gritou para a
mãe: "Mãe, o homem tá dizendo que amanhã não vai chover
aqui não". A mãe não respondeu.
"Mas",
pensou consigo Francisco, "não custa nada olhar as nuvens,
antes de sair de casa" e levou a colher à boca lembrando da
sabedoria de sua vó.
Pio
XII, Maranhão, 18/04/2012.
Do
professor Gilcênio para minha galerinha do Cema.
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